A REVOLUÇÃO dA SAÚDE MENTAL já começou
A Dieta Cetogênica no Tratamento do TOC: Casos Reais de Remissão
6/4/20259 min read


Em abril de 2025, os pesquisadores Aaron John MacDonald e Christopher Michael Palmer, do McLean Hospital e da Harvard Medical School, publicaram um estudo inovador na revista Frontiers in Psychiatry intitulado “Ketogenic Diet as a Therapeutic Intervention for Obsessive-Compulsive Disorder: a case series of three patients”.
O artigo apresenta três casos clínicos de pacientes diagnosticados com Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC) que alcançaram remissão dos sintomas após adotarem uma dieta cetogênica e estão sem tomar qualquer medicamento.
A seguir, leia o relato dos casos e, mais abaixo, um resumo dos principais pontos do estudo de caso:
CASO 1
Paciente BB, um homem de 22 anos atualmente cursando graduação em Harvard, foi diagnosticado com transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) e transtorno de ansiedade generalizada (TAG) aos 4 anos de idade. Seus sintomas começaram aos 18 meses, quando seus pais notaram que ele alinhava objetos com frequência. Esse comportamento de organização persistiu durante as brincadeiras, em que ele frequentemente arrumava e organizava os brinquedos dos colegas. Aos 3 anos, funcionários da creche observaram lavagens excessivas das mãos. Aos 4 anos, ele apresentava compulsões por simetria: se girasse em um sentido, sentia necessidade de girar no sentido oposto para "equilibrar". Ao abraçar ou beijar os pais, fazia isso igualmente em ambos os lados, muitas vezes em pares. Nas aulas de arte, produzia apenas obras simétricas.
Aos 9 anos, seus pais removeram grãos da dieta dele devido a preocupações com o peso corporal, notando inesperadamente uma redução dramática nos sintomas de TOC. Entre os 9 e os 13 anos, continuaram eliminando alimentos específicos para observar os efeitos. Aos 15, BB descobriu que a dieta cetogênica (KD) era a mais eficaz no controle dos sintomas. Em apenas duas semanas após iniciar a dieta, houve cessação completa dos comportamentos ritualísticos, restando apenas pensamentos intrusivos ocasionais. Embora os sintomas ressurgissem em momentos de estresse, ele os controlava por meio da alimentação. Aos 17, iniciou terapia cognitivo-comportamental (TCC) com foco em distorções cognitivas.
Desvios da dieta cetogênica resultaram no retorno dos sintomas. Aos 16 anos, interrompeu a dieta durante férias para consumir alimentos ricos em carboidratos. Nos dias seguintes, passou a coletar frascos de shampoo e condicionador do hotel e ficava acordado até tarde organizando-os em fileiras perfeitas. Desde então, tem seguido a dieta com disciplina, com desvios pontuais envolvendo pequenos lanches com carboidratos.
A pontuação de BB na escala Y-BOCS caiu de 27 para 4. Atualmente, sua dieta inclui carnes, ovos, laticínios, vegetais e oleaginosas. Eventualmente, consome frutas de baixo índice glicêmico, como framboesas e amoras. Estima que pode se desviar da dieta uma ou duas vezes por mês sem retorno dos sintomas de TOC. Além disso, relata melhora nos sintomas de eczema que apresentava desde a infância. Para garantir que permanece em cetose, mede ocasionalmente a razão cetona-glicose com monitores domésticos de sangue — embora já tenha feito essa medição diariamente.
Perspectiva do paciente
“A dieta cetogênica foi decisiva para resolver meu TOC, transtornos de humor e dificuldades de concentração. Sem as mudanças alimentares que fiz, eu não teria tido condições mentais para me sair bem o suficiente no ensino médio e entrar em Harvard, ou em qualquer outra faculdade.”
CASO 2
Paciente NM, uma mulher de 35 anos, desenvolveu sintomas de TOC aos 16 anos, após vivenciar um tiroteio em massa traumático próximo à sua escola. O evento desencadeou pensamentos intrusivos marcados pelo medo de perder o controle e causar danos, o que levou a esforços obsessivos para evitar que “algo ruim” acontecesse. Em resposta, ela se desfez de todos os cachecóis, cintos e objetos cortantes, com medo de que pudesse agir de acordo com esses pensamentos. Com receio de machucar sua família, NM começou a se isolar, permanecendo acordada à noite e dormindo durante o dia para evitar contato com os irmãos e os pais. Ela frequentemente pensava em fugir de casa e, por vezes, engajava-se em comportamentos autolesivos não suicidas, batendo a cabeça para aliviar os pensamentos intrusivos.
Ao escolher uma faculdade, decidiu estudar o mais longe possível de casa, para proteger a família de qualquer mal que temia causar. Após se mudar, os sintomas persistiram, agora direcionados aos novos colegas de quarto. Passava longos períodos sozinha, fazendo caminhadas para evitar estar perto de outras pessoas. Em uma ocasião, ficou fora até a meia-noite, sem conseguir voltar para sua residência. Sua família a levou a um psicólogo, que diagnosticou TOC aos 20 anos.
Após algumas sessões de terapia, ela decidiu trancar os estudos temporariamente e voltou para casa, para continuar o tratamento. Dependia da mãe para levá-la às consultas, devido ao medo de machucar outras pessoas ao dirigir. Iniciou terapia cognitivo-comportamental (TCC), com foco em exposição e prevenção de resposta, para ajudá-la a lidar com os pensamentos intrusivos sem evitá-los. Embora a abordagem tenha ajudado a manejar os sintomas, os pensamentos obsessivos e a necessidade de isolamento continuavam sendo um grande fardo. Um psiquiatra sugeriu o uso de um antidepressivo ISRS, mas NM recusou devido a preocupações com efeitos adversos. A continuidade da TCC permitiu reduzir os comportamentos de evitação o suficiente para que ela voltasse à faculdade e concluísse o curso.
Após a formatura, entretanto, o TOC retornou com força total quando foi morar com o parceiro, aos 31 anos. Voltou a ter pensamentos intrusivos e um forte impulso de se isolar. Nesse período, também notou uma coloração azulada no abdômen durante o banho. Preocupada com esse e outros sinais de piora na saúde geral, decidiu fazer uma intervenção alimentar: iniciou a dieta cetogênica. Sua alimentação passou a ser composta por carnes, ovos, laticínios e frutas e vegetais com baixo teor de carboidrato.
NM relata uma redução significativa dos pensamentos intrusivos e dos comportamentos de evitação em apenas duas semanas após começar a dieta cetogênica. Animada com a melhora, seguiu a dieta por três anos e permanece quase sem sintomas. Sua pontuação na escala Y-BOCS caiu de 22 para 3 após a mudança alimentar. Reintroduções de alimentos ricos em carboidratos provocam retorno dos sintomas, que ela descreve como “nadar em um lago enquanto uma tempestade se aproxima”. Para monitorar a remissão, NM mede periodicamente os níveis de cetonas no sangue e, atualmente, está experimentando a reintrodução gradual de alguns alimentos. Ao iniciar a dieta, manteve um diário com 51 medições de cetonas ao longo de um ano e meio, a maioria delas semanais, com valores entre 0,4 mmol/L e 3,7 mmol/L. Ela não observou uma correlação direta entre o nível de cetose e a redução dos sintomas, mas aponta que sair da dieta leva ao retorno dos sintomas, o que atribui à interrupção da cetose.
Relato da paciente:
“Eu costumava dizer a mim mesma, nos momentos mais sombrios do TOC: ‘A única saída é a morte’. Hoje, fico feliz em dizer que encontrei outro caminho. E me deixaria ainda mais feliz saber que outras pessoas podem conhecer a cetose como uma forma de acabar com o próprio sofrimento”
CASO 3
A paciente GH é uma mulher de 47 anos diagnosticada com Depressão Pós-Parto (DPP) aos 28, Transtorno Bipolar aos 34, TOC aos 35 e tireoidite de Hashimoto aos 44. Ela tem histórico de infecção por estreptococo e vírus Epstein–Barr (EBV), embora a data exata seja incerta. Testou positivo para anticorpos contra o EBV aos 47 anos, após a morte de sua mãe por linfoma associado ao vírus, e lembra-se de ter tido amigdalite na adolescência.
Após o nascimento de seu filho, aos 28 anos, desenvolveu sintomas de TOC, como obsessão por organização, perfeccionismo e rígido cumprimento de regras. Embora o diagnóstico formal tenha sido feito aos 35, os sintomas começaram a se manifestar ainda durante a DPP. Ela frequentemente ficava acordada até as 4h da manhã limpando e organizando a casa, recusando-se a dormir até que tudo estivesse exatamente como queria. Como escoteira voluntária, escrevia e-mails longos aos colegas, às vezes com mais de quatro páginas. Tentou trabalhar como designer gráfico, educadora em parque municipal e no varejo entre os 28 e 33 anos, mas o perfeccionismo e a rigidez a impediam de manter-se nessas funções.
O diagnóstico de TOC foi confirmado seis anos após o nascimento de seu filho, quando o marido notou mudanças drásticas em seu humor. Durante uma conversa sobre sua saúde mental, ela revelou ter pensamentos suicidas e ideias intrusivas de machucar o filho. O marido a levou imediatamente ao pronto-socorro. Após avaliação, ela foi medicada e recebeu alta, mas decidiram que o filho deveria temporariamente ficar com a irmã de GH.
Seu histórico de medicação inclui fluoxetina (Prozac), quetiapina (Seroquel), vilazodona (Viibryd), mirtazapina (Remeron) e alprazolam (Frontal). Fluoxetina e alprazolam foram prescritos para a DPP, e os demais para o Transtorno Bipolar. Fluoxetina foi suspensa rapidamente por causar dores de cabeça. Vilazodona foi descontinuada por custo antes de avaliar sua eficácia. Mirtazapina não trouxe melhora. A quetiapina reduziu os sintomas obsessivos relacionados à ordem e perfeccionismo, mas causava sedação significativa, limitando sua energia. Mesmo assim, ela continuou tomando para controlar os sintomas. GH também fez psicoterapia por 3 anos, mas teve dificuldade em iniciar exposição com prevenção de resposta devido à ansiedade.
Aos 40 anos, iniciou a dieta cetogênica (DC) com o objetivo de perder peso, perdendo cerca de 23 kg. Embora não tenha confirmado a cetose com exames, notou gosto frutado e metálico na boca logo após iniciar. Depois de um ano de DC, relatou cessação completa dos impulsos obsessivos por organização e regras. Como resultado, desejou descontinuar a quetiapina para reduzir a sonolência e aumentar sua energia. Acreditando não precisar mais da medicação, reduziu a dose com orientação médica ao longo de dois meses. Surpreendentemente, conseguiu parar com segurança e permaneceu livre de sintomas. Livre dos efeitos colaterais, passou a se exercitar regularmente, caminhar e praticar yoga.
Quatro anos após manter-se fiel à dieta, um exame de perfil lipídico revelou colesterol total de 452 mg/dL, LDL de 363, HDL de 75 e triglicerídeos de 96. Seu médico recomendou a introdução de vegetais ricos em amido, começando por uma batata-doce por dia. Em três meses, apresentou sonolência intensa e piora da depressão. Mesmo reduzindo para meia batata-doce, não houve melhora. Após cinco meses, sua letargia e irritabilidade aumentaram, com crises frequentes. Com um quarto de batata-doce, abandonou completamente os exercícios. Em seguida, os sintomas obsessivos retornaram, incluindo limpeza compulsiva à noite.
Diante dessa recaída, GH voltou à dieta cetogênica. Após quatro meses, os sintomas desapareceram e ela retomou as atividades físicas, recuperando a energia e entusiasmo. Está em remissão há 7 anos — os últimos 6 sem medicações psiquiátricas. Sua pontuação na Y-BOCS caiu de 21 para 0 com a intervenção. Atualmente segue uma dieta carnívora (carne bovina, suína e frango) e consome ocasionalmente frutas vermelhas, cebolas e tomates, mantendo uma abordagem de baixo carboidrato.
Relato da paciente:
“Antes de eliminar açúcares e grãos da minha dieta, eu era vazia, incapaz de viver plenamente. Sinto que perdi o melhor da infância dos meus filhos, sedada e oprimida pelos pensamentos. Hoje, amo a pessoa que sou — viva, ativa e decidida a não perder mais nenhum segundo.”
Sobre o Estudo de Caso
A dieta cetogênica está sendo investigada como uma intervenção terapêutica para tratar distúrbios neuropsiquiátricos. Pesquisas emergentes sugerem que muitos desses transtornos compartilham mecanismos fisiopatológicos semelhantes — como disfunção mitocondrial, inflamação e desequilíbrios nos neurotransmissores — e que a dieta cetogênica pode ajudar a modular essas alterações.
Este estudo relata o caso de três indivíduos que apresentaram significativa redução dos sintomas de TOC após adotarem a dieta cetogênica.
Métodos
Os participantes foram recrutados por meio das redes profissionais e pessoais dos autores. Cada paciente foi entrevistado, e foram coletadas evidências do histórico de saúde mental. Os sintomas de TOC foram avaliados retrospectivamente antes e depois da adoção da dieta, utilizando a Escala Yale-Brown de Obsessões e Compulsões (Y-BOCS).
Resultados
Os três participantes alcançaram remissão completa dos sintomas e interromperam o uso de medicações. A adoção da dieta cetogênica resultou em uma redução média de 21 pontos na escala Y-BOCS, o que corresponde a uma melhora média de 90,5%. Em todos os casos, qualquer interrupção da dieta levou à recorrência dos sintomas, que desapareceram novamente com o retorno à cetose.
Conclusão
A dieta cetogênica pode ser uma alternativa terapêutica promissora para o tratamento do TOC. Sua capacidade de modular disfunções metabólicas associadas ao transtorno pode atuar diretamente nos mecanismos subjacentes da doença. São necessários ensaios clínicos controlados para avaliar melhor a eficácia e a segurança dessa abordagem no tratamento do TOC.
Acesse o artigo original aqui.
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