Você já deve ter ouvido falar que a Dieta Cetogênica é a dieta da moda. Muitos profissionais de saúde e reportagens falam isso, mas será que é mesmo?
Bom, quem fala isso certamente não conhece a história dessa dieta.
A dieta cetogênica foi criada há mais de um século, em 1921. E, ao contrário do que muitos pensam, não tinha nada a ver com perda de peso. A cetogênica foi uma dieta criada pela medicina para modular e melhorar o funcionamento cerebral.
O que acontece é que desde a época de Hipócrates (no mínimo) se sabe que pessoas com epilepsia melhoram das crises convulsivas quando fazem jejum de alguns dias. Mas, ao voltarem a se alimentar, as crises voltam com a mesma intensidade.
Como obviamente não se pode ficar em jejum para sempre, a pergunta que ficava era: “o que acontece no jejum prolongado que faz com que as crises melhorem?”
A hipótese era de que, no jejum, o corpo começa a produzir Corpos Cetônicos (ou Cetonas), que são fabricados no fígado a partir do metabolismo das gorduras, e que isso seria o fator de melhora.
Nos anos 1920, o médico norte-americano Russel Wilder resolveu testar uma dieta que imitasse o estado metabólico do jejum, em que há produção de corpos cetônicos, em crianças e adultos com epilepsia, e ela se mostrou bastante efetiva.
Por isso o termo “Cetogênica”, “que gera corpos cetônicos”. Desde lá, existem diversos estudos científicos de alta qualidade confirmando a eficácia da Dieta Cetogênica em quadros de epilepsia, inclusive os que não melhoram com diferentes medicamentos.
Dieta Cetogênica na Psiquiatria
Nas últimas décadas, alguns colegas psiquiatras começaram a testar o uso da dieta cetogênica para tratar pacientes psiquiátricos. Isso por dois motivos:
O primeiro deles é que, infelizmente, todo profissional que atua com saúde mental sabe que o número de pessoas que seguem tratamentos psiquiátricos e não melhoram é muito grande. Sâo pessoas que tomam seus remédios, comparecem às sessões de terapia, às consultas psiquiátricas e, mesmo assim, continuam com uma qualidade de vida muito ruim. Por isso, pesquisar e buscar outros tratamentos para ajudar os pacientes é algo natural para muitos psiquiatras.
O segundo motivo é que, todo psiquiatra usa, em sua prática clínica, remédios desenvolvidos primariamente para a epilepsia, e sabemos há muito tempo que a Dieta Cetogênica é um tratamento eficaz para epilepsia. Logo, se diversos remédios para epilepsia são usados em psiquiatria, e a Dieta Cetogênica é um tratamento eficaz para a epilepsia, por que não testar essa dieta nos casos psiquiátricos?
E os resultados foram animadores. Esses psiquiatras pioneiros começaram a testemunhar histórias surpreendentes de remissão de casos sérios Transtornos Psiquiátricos severos (Esquizofrenia, Transtorno Bipolar, Depressão Resistente). Um desses pioneiros é o francês Albert Danan, que em 2022, divulgou um estudo bastante interessante sobre o uso da dieta cetogênica na psiquiatria.
Este estudo relata a aplicação da dieta cetogênica em pacientes com quadros psiquiátricos que não tiveram melhora com os tratamentos feitos tradicionalmente (os chamados Casos Refratários ou Resistentes). Eram pessoas com quadros de Esquizofrenia, Transtorno Bipolar e Depressão Maior. Em média, estavam doentes há uma década – e alguns sofriam com seus quadros psiquiátricos há 30 anos. Tomavam, em média, 5 remédios psiquiátricos. Ou seja, eram casos realmente graves. Dr Albert Danan convidou este grupo de 31 pacientes a internar-se voluntariamente em um hospital, onde adotaram a dieta cetogênica de forma terapêutica e monitorada.
Dos 31 pacientes selecionados, 28 seguiram a dieta (um número bastante alto). Agora o mais animador: TODOS tiveram melhora significativa com a dieta cetogênica. E mais:
- 43% atingiram remissão de seus quadros psiquiátricos iniciais
- 64% deixaram o hospital com menos remédios psiquiátricos
Este estudo é um marco na Psiquiatria Nutricional e Metabólica, mostrando o potencial que a intervenção alimentar tem na psiquiatria.
Sempre digo que a terapia cetogênica é, provavelmente, o melhor tratamento que temos em saúde mental. Não é uma bala de prata, não funciona em 100% dos casos, mas, nos meus 20 anos de psiquiatria, nunca vi algo tão eficaz.
Link do estudo citado neste texto:
https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/35873236/